Maria, à semelhança de Jesus, é fonte que nunca se esgota, a nascente onde mais se bebe e mais jorra água viva. Não é somente pelo caminho da inteligência que podemos compreender a grandeza de Maria, é necessário aproximar-se dela com o amor de filho e aí o seu coração de Mãe se abre para nós e ela vai sussurrando palavras que só o amor pode compreender. A Igreja sempre nos tem apresentado Maria como a excelsa filha de Sião que, na sua casa de Nazaré, vivia à espera do Messias e que, um dia, vê-se assumindo a sua responsabilidade de Mãe do Salvador, permanecendo fiel ao projeto de Deus silenciosamente, sem nunca interferir na vida de Jesus. As palavras que os evangelistas nos transmitem são de uma sobriedade que, de um lado nos comove e nos deixa maravilhados, do outro lado nos agridem e nos sentimos com vontade de gritar: “por que nos disseste tão pouco sobre uma mulher tão grande?”. Mas as respostas não chegam; pelo silêncio da fé e pelo dinamismo da esperança é que o amor se faz gesto concreto.
Temos meditado o Magnificat e vimos como esta oração surgiu espontaneamente num coração feito serviço generoso. E como Maria nos ensinou a olhar o nosso passado como lugar teológico e campo da experiência religiosa para contemplar as ações do Senhor. Cada vez mais sinto que o passado é um sacramento da memória que deve ser enaltecido porque louva e canta as vitórias de Deus, e da memória que deve ser purificada de tantas lembranças tristes e de tantos resquícios de pecados que não nos deixam entrever a beleza do horizonte.
Mas uma oração que se baseia sobre o passado e se fecha sobre o presente, sem dúvida, seria uma oração incompleta e não teria o vento suave e agitador do futuro. Nós somos acostumados a olhar o amanhã como a transformação da semente lançada rapidamente no fugaz presente que nos é dado. Estando em oração me veio uma idéia que pode até ser considerada “estranha, estúpida, peregrina e rara”, mas visto que para mim me ajudou, porque também não poderia ajudar aos outros? E a vida, ao ser sempre partilhada, se enriquece na medida em que reciprocamente sabemos colocar na mesa cotidiana o que se passa dentro de nós.
O passado não existe. Alguém dos meus poucos leitores poderá objetar: como o passado não existe? Ele está aí, diante de nós como memória, lembrança, como momento que nos atormenta e como estímulo para sermos agradecidos. Mas o passado não é outra coisa que acúmulo de tantos momentos presentes que se foram sem mais voltar. No mesmo instante em que nós achamos que estamos no presente nos encontramos já jogados no passado, que não é outra coisa senão o presente que passa. Diante do passado devemos assumir a atitude de Maria: fazer que seja um “eterno presente”, onde Deus “onipresente” vive sempre no presente da história e nele não há passado. Viver o presente dando-lhe o valor do eterno... É no aqui e agira, rápido e fugaz como a onda do mar que no mesmo instante que vem já se foi, ou a brisa do vento que você não pode captar. O presente não é outra coisa que uma janela que se abre no futuro, que nos estimula e nos convida a não perder de vista o amanhã.. Somente quando chegarmos na eternidade aí estaremos dinamicamente parados no presente, contemplando para sempre o amor de Deus que não foi, nem será, mas é.
Sim, porque eterno é seu amor! Como é forte no nosso coração esta convicção do presente de Deus em nossa vida! Um presente que, ultrapassando todas as limitações do tempo e do espaço nos faz sentir que somos chamados a viver com uma forma de eternidade o nosso tempo, sacramento que nos é dado viver.
Maria acolhe o futuro
O futuro nos atemoriza, lança-nos na insegurança e na incerteza. Precisamos que alguém, em quem nós confiamos, possa dizer-nos uma palavra de coragem e de ânimo. A maioria dos verbos que empregamos está no futuro, porque é o desejo de que algo de novo possa acontecer na nossa vida. O mesmo Jesus nos oferece o salmo do futuro, a oração de amanhã, que são as bem-aventuranças. A mesma palavra “bem-aventurança” que dizer “bem que ainda não chegou mas chegará” e se fará presente em nós. Olhando para Maria podemos ver nela o medo de um presente que lhe espera, mas a coragem para olhar ao futuro que lhe é assegurado, não por palavras humanas, mas pela palavra do mesmo Deus.
Rezar é saber acolher na fé o nosso futuro é crer que a força da palavra de Deus irá se realizar em nós. Queremos nos aproximar da Virgem Maria e, com ela, aprender a rezar o nosso futuro, dizendo incondicionalmente o nosso SIM ao que se abre à nossa frente, embora nós não o conheçamos. Crer é amar alguém. Para sempre o amor, a amizade, são dons que em nós somente são vividos relembrando o passado e o presente, e principalmente contemplando o amanhã que, com sua incerteza, tenta nos amedrontar. Mas, na certeza da Palavra d e Deus, iremos para frente, aconteça o que acontecer.
Conceberás e darás à luz um filho a quem chamarás Jesus. (Lc 1,31)
Este três verbos, conjugados no futuro, são como uma luz que clareia a noite escura da Virgem Maria. Ela sente-se revigorada na sua fé e assume o projeto de Deus sem, provavelmente, compreendê-lo na sua plenitude e totalidade. O que importa, está claro, é que ela quer fazer a vontade de Deus. Quer ser um SIM perenemente, sem meias medidas e sem meio termo. A primeira atitude do anjo é confiar-lhe o grande segredo, que será sempre incompreensível para a inteligência humana e ninguém poderá compreendê-lo a não ser pelos olhos da fé e do amor.
Conceberás: todos nós somos chamados a conceber a vida. Uma vida que não é fruto do nosso trabalho e nem do trabalho humano, mas é dom de Deus. Maria é grande porque concebe pela inteligência, pelo amor, pela fé, e faz que isto se torne vida nela e que esta vida seja doada aos outros em plenitude. Não fomos chamados para sermos “estéreis”, mas fecundos. O nosso mundo se faz cada vez mais um mundo estéril, feito de palavras vazias que não traduzem o que significam. Palavras enganadoras que nos embalam os olhos e impedem de realizar o nosso projeto de Amor. Conceber é se abrir totalmente á ação do outro. Ninguém concebe por si mesmo e a si mesmo. A concepção é o encontro de duas vontades de gerar a vida: a vontade de Deus que chama a vontade do ser humano e este responde com o seu sim. Na nossa oração silenciosa é importante poder nos interrogar: o que sou chamado a conceber? Como eu me deixo fecundar pela ação de Deus? Ou vivo a resistência do egoísmo e do orgulho que me impedem de ser gerador e geradora de vida nova?
Darás à luz: o anjo relembra a Maria que é insuficiente conceber, é necessário dar à luz. Todo aborto foi concebido mas não foi dado à luz. Todo projeto que nós concebemos mas não o damos à luz é aborto. Hoje não falta concepções de tantos projetos maravilhosos mas que, não raramente, ficam no papel, na mente, como projetos e não são dados à luz. Há em nós o medo do futuro, do incompreensível. Há muitas pessoas que concebem o projeto de rezar, de fundar uma comunidade, de entrar numa comunidade, de ajudar a custear obras de evangelização... concebem mas não dão à luz. São abortos atrás de abortos que matam a vida no seu nascer. Maria concebe e dá à luz.. Um poeta italiano, Dante Alighieri, autor de uma obra da humanidade chamada “divina comédia”, diz que o inferno está ladrilhado de bons propósitos não realizados. O cristão é alguém que concebe e dá à luz, com todas as dores de parto, que são perdas, separações... É separar-se de tudo o que não é Deus para sermos só e exclusivamente de Deus.
E o chamarás Jesus: É sumamente interessante a presença destes três verbos que o evangelista Lucas nos oferece no seu Evangelho. Não é suficiente conceber e dar á vida...é necessário dar o nome, que quer dizer “assumir a maternidade e paternidade” do que fazemos. Não fugir das nossas responsabilidades. Na Bíblia dar o nome ou chamar com o nome ou revelar o próprio nome é conhecer intimamente alguém. Por isso o mesmo Deus, Pai do seu Filho unigênito, dá o nome, e mais, encarrega a alguém de dar este nome. Em Mateus será José quem dá o nome; em Lucas este encargo é reservado a Maria. O que importa é que não são os homens que escolhem o nome, mas sim o mesmo Deus. Na oração é que concebemos a vida, damos à luz e damos o nome ao que fazemos. Assumimos a nossa parte de responsabilidade e de vida.
Ele será grande...: Nestas palavras proféticas podemos contemplar toda a grandeza de Jesus ao longo de sua vida terrena: seus milagres, suas palavras, suas obras, tudo o que ele fez. A grandeza de uma pessoa humana não se mede pela conta do banco, nem pelo título de universidade que tem, nem pela casa onde mora. Tudo isto é papel de embrulho que, com sua beleza e luzes, podem nos enganar. A grandeza da pessoa se mede pelo amor e pela sua força interior com que anuncia o Evangelho e pela sua configuração ao mistério do Cristo redentor.
O Papa João Paulo II, nestas palavras descreve toda a noite escura de Nossa Senhora:
“Mediante essa sua fé, Maria está perfeitamente unida a Cristo no seu despojamento... Aos pés da cruz Maria participa mediante a fé no mistério desconcertante desse despojamento. Isso constitui, talvez, a mais profunda ‘kénose’ da fé na história da humanidade. Mediante a fé, a Mãe participa da morte do Filho, da sua morte redentora; mas, bem diferente da fé dos discípulos, que se davam à fuga, a fé de Maria era muito mais esclarecida... Sim, verdadeiramente, ‘feliz daquela que acreditou’! Estas palavras, pronunciadas por Isabel já depois da Anunciação, parecem ressoar aqui, aos pés da cruz, com suprema eloqüência; e a força que elas encerram torna-se penetrante”. (Redemptoris Mater 18 e 19)
Maria não foi poupada do sofrimento porque era a Mãe de Jesus, e nem o mesmo Jesus foi poupado do sofrimento, sacramento do amor de Deus que nos torna capazes de contemplar a glória e de viver uma intimidade de amor especial e única. O amor é sofrimento, como encontramos em alguns santos; é dos carismas raros mas presentes na vida dos que Deus ama. “Agora que sofro sei que Deus me ama”, é uma jaculatória que, de vem em quando, com muito temor, costumo dizer a Deus como pequena adoração da minha vida..
Como será possível isto, se não conheço homem?
Estas palavras não revelam incerteza e nem dúvida, e nem falta de confiança por parte de Maria. Ela está totalmente aberta a acolher o mistério. Faz uma contestação e manifesta, ao mesmo tempo um seu desejo. A constatação de que ela não é casada, e o desejo de permanecer virgem, de consagrar toda a sua vida ao Senhor, de ser propriedade exclusiva de Deus que ama desde a tenra idade. O futuro não apavora Maria mas ela quer de Deus um sinal que lhe conceda segurança e a tranqüilize e o seu coração está disposto a fazer sempre e em todas as circunstâncias a vontade de Deus. O orante está disposto a ser de Deus, mesmo quando não lhe é fácil compreender a mensagem que recebe na sua oração. A oração verdadeira não é determinista, cega, mas buscadora da verdade e aberta ao entendimento. Quando nós rezamos sempre podemos fazer perguntas para Deus numa atitude de humildade. Quantas vezes, diante dos projetos que nascem na nossa consciência sentimos surgir dentro de nós o questionamento: como será possível isto? Na escola de Maria se aprende a fazer perguntas a Deus na simplicidade e na humildade. E temos no coração a certeza de que ele vai nos responder.
O Espírito Santo virá sobre ti e te cobrirá com a sua sombra.
A resposta do anjo é carregada de sentido e de ensinamento que não podemos deixar de colocar em evidência. Antes de tudo Deus não quer que nós fiquemos perturbados por muito tempo diante de suas propostas de amor, por isso ele se apressa em explicar e a fazer-nos compreender que não pede nada de impossível e nem contraria e supre as nossas forças, mas tudo o que nos é pedido é fortalecido pela sua presença amorosa de Deus da vida.
Maria é convidada a permanecer serena e tranqüila porque o “Espírito Santo virá sobre ti”. Quer dizer que a maternidade a que Maria é chamada supera e ultrapassa o humano. Não será necessária a cooperação do homem. O homem, sexualmente falando, é dispensado nesta obra. Deus dispensou a cooperação masculina no processo da encarnação mas não a cooperação feminina. Este aspecto tão bonito e dignificante para a mulher nos faz perceber como, no seu poder, o Senhor aprecia a cooperação para realizar os seus planos de salvação. Deus feito carne em Jesus entra no mundo pela porta de uma mulher, pelo sim de Maria. A intervenção criadora de Deus se realiza pelo mesmo poder divino.
A sombra cobrirá. Esta sombra, de quem fala o evangelista, é ao mesmo tempo a glória de Deus e o poder do Senhor. Maria se torna arca da aliança nova, e morada de Deus no sentido mais real e profundo. A nossa oração é uma nova gestação de uma vida nova, que acontece sempre que oramos. Sempre que nos colocamos em oração sentimos que o Espírito Santo vem sobre nós e a sua sombra no cobre, uma vida nova vai nascer, um amor vigoroso e corajoso nos impele a novas obras e em novos caminhos. Na vida de cada ser humano aberto à graça acontece misticamente a descida do Espírito e da glória de Deus que nos envolve em cada momento. Se nós pudéssemos ver uma alma em graça e amada por Deus a veríamos circundada de toda a glória e de todos os anjos do céu, que a defendem por ser morada permanente do Deus vivo. Tem razão neste sentido a Beata Elisabete da Trindade, carmelita descalça apaixonada pelo mistério da habitação da Santíssima Trindade, quando diz que o céu mora dentro de nós porque Deus habita em nós.
“Saber que um ser chamado amor habita em mim... isto mudou a minha vida.”
Aquele que nascerá de ti será chamado Filho do Altíssimo.
Há, nestes verbos conjugados no futuro, um horizonte imenso que nos toca e nos comove. É o nosso futuro que se vislumbra e se abre diante de nós como plenitude de nossa santidade e de nossa vocação. É no silêncio adorante da oração que a vida nasce e se forma lentamente. Não inspira-nos coisas, momentos passageiros e nem tampouco idéias que são mutáveis, segundo onde inspira o vento, mas tudo o que o cristão gera na fé, na esperança e no amor é Alguém: Cristo Jesus. Na medida em que encarnamos a palavra do Senhor na nossa vida nos tornamos geradores do mesmo Jesus. Nunca devemos esquecer, para compreender melhor isto, as palavras pronunciadas por Jesus: “Quem é minha mãe... aquele que escuta e pratica a minha palavra é meu irmão, irmã, mãe”.
Será chamado... Na oração percebemos algo de nosso de transformador. Tudo o que se faz traz a marca do amor e é, sem dúvida, “cristificado”. Não mais agimos por motivos humanos ou em vista de glória humana ou de auto-projeção, mas somente por motivos espirituais e crísticos. Não há dúvida de que estas palavras do anjo podem ser consideradas como “uma profissão de fé” na humanidade e divindade de Jesus. Jesus, totalmente homem, é o Verbo revestido de carne, mas ao mesmo tempo totalmente divino como filho de Deus. É o primeiro credo que não foi explanado aos homens por outros homens, mas pelo mesmo anjo Gabriel, que foi enviado a nos dar a boa notícia de que o Senhor viria habitar entre nós. É na oração que fazemos a cada instante a nossa profissão de fé e nos lançamos, corajosos, para dizer a Deus como Maria o nosso sim, proclamando-nos conscientemente “servos do Senhor”. Teresa de Ávila, quando fala das pessoas que rezam, chama-os “servos do amor”.. Sempre quem se coloca diante de Deus para louvá-lo, bendizê-lo, suplicar-lhe algo, faz-se antes de tudo servo do amor.
Uma espada atravessará tua alma!
Em toda a narração da infância de Jesus em Lucas, assistimos à glória de Deus, do cântico dos pastores à visita do magos, à oferta dos presentes...é tudo festa. A única nota de sofrimento e de dor que se assoma ao horizonte do coração de Maria são as palavras proféticas do velho Simeão que, acolhendo Jesus no templo, se despede da história com alegria, porque viu a salvação e pode cantar o seu “nunc dimitis”: agora podeis deixar o vosso servo ir em paz... Mas ao mesmo tempo anuncia também a Maria um futuro triste, cheio de dor. Uma espada atravessará o teu coração... Não se pode participar da história da salvação fugindo do mesmo destino de Jesus que é marcado pela glória, mas dentro dela se insere o sofrimento, a cruz, a dor. A glória, a alegria da encarnação e da ressurreição fazem como que uma moldura à paixão e morte do mesmo Jesus. A nossa oração é sempre alegria, mas nela está sempre presente a dor. Saber aceitar a dor é uma das formas mais belas de oração. Não devemos ter medo da cruz, o mesmo João da Cruz recorda, com sabedoria: “aquele que não ama a cruz de Cristo não ama a glória de Cristo”.. Saber gloriar, como Paulo, da cruz de Jesus, presente em nossa vida.
Prontos, como Maria, a dizer ‘sim’ ao amor quando pede que nós participemos no projeto da redenção através da cruz, da morte, da dor.
Com Maria de Nazaré temos aprendido que a nossa vida se projeta no futuro da história e, num gesto de fé inabalável, devemos aceitar desde já o que acontecer amanhã. Por isso é muito bom todos os dias oferecer ao Senhor tudo o que faremos, tudo o que diremos, tudo o que seremos, e tudo que irá nos acontecer. Queremos acolher na fé, como dom do amor às vezes incompreensível, mas sempre amor de Deus.
Todas as Segundas Feiras - Grupo de Oração (Centro Paróquial) , Quartas e Quintas Feiras : louvor - Igreja Matriz (Quarta) e G.O / Louvor - Capela de São Jose(Quinta), Transmissão ao vivo a partir das 19:00 horas. Radio Online Cristo em Nós agora online 24 horas.
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